domingo, 30 de junho de 2013

Batatas fritas frias

Diane Arbus


























Ligo mas ninguém atende. Volto a ligar mais tarde. Disponham da minha vida como eu disponho da dos outros e andaremos aqui em círculos e tentativas de risos meus. Risos porque perder é morte. Rio. Rio. Rio enquanto abro as pernas e urino. De pé. Junto à árvore desnuda. O plátano que ontem estava junto à cadeira onde te sentei não faz parte desta história. No meu peito secaram-se as borbulhas. Agora resta esta pele de velha pescadora.

As putas das manhãs. As putas das minhas manhãs. As filhas da puta das minhas manhãs. Entornam-se na minha cabeça e deixam-me o cabelo com ervas e descampados à porta de casa. Estava sol naquele dia. Estava sol e eu deixei aquele lugar onde te conheci. Comi ervas secas enquanto te falava e calejei os calcanhares no cimento quente. De uma janela vinha luz. Sentei-me no passeio olhando os meus pés nas manhãs que se fizeram noite. És ignorante das pedras que apanhei com os dedos. Saberás dos tsunamis?

Eu não pedi isto. Tu pediste? Pois, não paguemos. Comamos e não paguemos a conta. Fujamos no final. À polícia. Aos ladrões. Ao mundo. Por um dia. Ou dois. Por uma hora. Ou um minuto. Na minha cabeça. E no ventre. No meu ventre. É a ele que tudo torna. E retorna. Às minhas tripas uterinas.

Tenho um pai amarelo. Está deitado sob trezentos quilos de terra. Ou serão mais? Pergunto-me quanto pesa a terra sob o corpo. Quanto pesa? Diz-me quanto pesa. Diz-me. Há uma obsessão em respostas e uma outra em ignorá-las. Baralhamos as cartas e voltamos a dar porque o jogo que me saiu não tinha Ases. E o teu? Era bom? Lamento... mas... de tanto me chamarem umbigo tornei-me buraco negro.


Está quieta. Fica quieta. Aí. Mantém-te direitinha. De pé. Quieta.

Ai.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Chaminés de pedra

Casino da Figueira, autor desconhecido

















Há uma janela do lado direito da cena. E uma outra ao centro. Ambas dão para um céu de junho chuvoso. Umas aves, talvez gaivotas, passam a voar. Talvez ao fundo apareçam telhados de casas, edifícios, igrejas, janelas, antenas e gruas. Talvez. Talvez não. Talvez haja uma ponte. E uns montes de pedra com arvoredo. Umas ruínas e um padre que reza uma missa. Um missal aberto numas mãos de dedos finos e ferrugentos. Porque há mãos que oxidam. E as que teimam em paralisar no tempo. E no espaço.


Falam-me em entrega. Os idiotas falam-me em entrega! Os imbecis falam-me em entrega! Porque raio todos me falam em entrega? E em satisfação. Em satisfazermo-nos como cão que sacia a sede. 

E eu tola. Eu crente. Eu na tentativa de fazer correr o sangue nas veias, dou a mão e corro. Deem-me um frigorífico e um fogão. Uma estante para colocar livros de lombada bonita. Uma bicicleta e um casaco. Dêem-me um telhado e um recibo de salário. Um patrão e um chefe. Deem-me ambição e angústia. Férias na praia e máquina fotográfica. Dêem-me tudo aquilo que não me espelha para que eu possa sentir-me... pertencente.

Ele disse odiar-me. E eu senti. Senti que posso ser odiada. E que nesse ódio posso sentir o amor. O amor que me é dedicado. Como um banho de imersão. Com espuma e sabonete de verbena. Meu amor, perdoa-me! Perdoa-me por ser este barco à deriva. E peço perdão sem arrependimento. Sou uma crente de cemitérios. E de choros. Sou crente de mensagens em lábios que quero meus. Só por um minuto. Ou dois. Concede-me uma vida e eu mostro-te o medo e a angústia de me sentar aqui nesta relva, vestida de disponível e de perna aberta.

Não rias. Falo sério. Não rias! Olha-me e vê. Vês os meus olhos? Raiados de álcool. Raiados de passado. Não brinco... Brincarei com a tua piloca. Enrolo-a no dedo e faço dela um caracol. Chupo-a. E sugo-a. Quero-a pequena. Pequena para brincar. Pequena caniche. Pequena mole. Pequena. E imensamente grande a rebentar. Como o meu desejo por ti. Por vezes devorador. De gruta e caverna. De peito e vagina. De colo e pés. Por vezes apaziguador. De sorriso tranquilo e sensualidade nos dedos. Lábios.

Está difícil mas é um começo. Está difícil. Tudo isto está difícil. Que faremos quando a noite se puser e estiver escuro? Que faremos? Diz-me amor, que faremos?